– Se nada importa realmente – disse eu – ao se tornar um homem de conhecimento, a pessoa se encontrará forçosamente tão vazia quanto meu amigo, e numa situação nada melhor.

– Isso não é verdade. Seu amigo está solitário porque há de morrer sem ver. Em sua vida, apenas envelheceu e agora tem de ter mais pena de si ainda do que antes. Sente que jogou fora 40 anos porque andou atrás de vitórias e só encontrou derrotas. Nunca há de saber que ser vitorioso e ser derrotado são a mesma coisa. Então, agora tem medo de mim porque eu lhe disse que você é igual a tudo o mais. Está sendo infantil. Nosso destino como homens é aprender e a gente procura o conhecimento como vai para a guerra; já lhe disse uma centena de vezes. Vai-se ao conhecimento ou à guerra com medo, com respeito, sabendo que se vai à guerra, e com uma confiança absoluta em si mesmo. Deposite sua confiança em si, não em mim.
(…)
E então você teme o vazio da vida de seu amigo. Mas não existe vazio na vida de um homem de conhecimento, posso garantir–lhe. Tudo está cheio até à borda.

Dom Juan levantou-se e esticou os braços, como se estivesse tocando em coisas no ar.

– Tudo está cheio até à borda – repetiu ele – e tudo é igual. Não sou como seu amigo que apenas envelheceu. Quando lhe digo que nada importa, não o digo do jeito que ele o faz. Para ele, sua luta não valeu a pena porque ele foi vencido; para mim não há vitória, nem derrota, nem vazio. Tudo está cheio até à borda; tudo é igual, e minha luta valeu a pena. A fim de se tornar um homem de conhecimento, a pessoa tem de ser um guerreiro, não uma criança choramingas. É preciso lutar sem desistir, sem reclamar, sem hesitar, até ver, só para compreender então que nada importa.

(Carlos Castañeda, Uma Estranha Realidade)

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