· “Uma das grandes manobras dos espreitadores é contrapor o mistério à estupidez que há em cada um de nós.” Explicou que as práticas da espreita não são coisas para alguém se rejubilar; na verdade, são completamente censuráveis. Sabendo disso, os novos videntes percebem que seria contra o interesse geral discutir ou praticar os princípios de espreita em consciência normal. Apontei-lhe uma incongruência. Ele dissera que não há meios de os guerreiros agirem no mundo enquanto se encontram em consciência intensificada, e também que espreitar é simples­mente comportar-se diante de pessoas de maneiras específicas. As duas afirmações contradiziam-se mutuamente.
– Por não ensiná-la em consciência normal referia-me apenas a ensiná-la a um nagual – disse ele. – O propósito de espreitar é duplo: primeiro, deslocar o ponto de aglutinação tão firmemente e a salvo quanto possível, e nada pode fazê-lo tão bem quanto a espreita; segundo, imprimir seus princípios a um nível tão profundo que o inventário humano seja ultrapassado, assim como a reação natural de recusar e julgar algo que possa ser ofensivo à razão.
Falei que duvidava sinceramente que eu conseguisse julgar ou recusar algo dessa forma. Riu e disse que eu não podia ser uma exceção, que iria reagir como todos os outros quando ouvisse sobre os feitos de um mestre espreitador, como seu benfeitor, o nagual Julian.
– Não estou exagerando quando lhe digo que o nagual Julian era o mais extraordinário espreitador que jamais conheci ­disse Dom Juan. – Você já ouviu de todos sobre seus talentos de espreita. Mas nunca lhe contei o que ele fez comigo.”

(O Fogo Interior, Carlos Castañeda)

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